A aclamação de D. João VI, Rei de Portugal. 1 |
O REINO UNIDO | |
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Com a restauração dos Bourbon no trono da França e o reestabelecimento de relações diplomáticas com Portugal, o Rio de Janeiro tornou-se, a partir de janeiro de 1816, destino de uma migração de cidadãos franceses que, por apoiarem o Império de Napoleão, caíram em desgraça perante o novo soberano, alguns deles artistas de renome em seu País. A ideia de fundar uma "colônia francesa" 2, que desenvolvesse as artes e os ofícios no novo reino partiu do secretário perpétuo do curso de Belas Artes do Instituto de França, Joachim Le Breton 3, que acabara de ser destituído do cargo de administrador do acervo do Museu do Louvre. Indicado pelo naturalista Alexander Von Humboldt ao marquês de Marialva, embaixador extraordinário do governo português em Paris, conseguiu convencê-lo a custear a viagem dele e dos companheiros de infortúnio ao Rio de Janeiro, sem qualquer outra promessa. A comissão chegou à cidade em 26 de março de 1816, no navio norte-americano Calphe; além de Le Breton, era composta por Pierre Dillon (secretário); Jean-Baptiste De Bret 4 (pintor de história e decoração); Nicolas-Antoine Taunay 5 (pintor); Auguste-Marie Taunay (escultor); Auguste Henri-Victor Grandjean de Montigny (arquiteto); Charles-Simon Pradier (gravador); François Ovide (engenheiro mecânico, acompanhado de um serralheiro e de um carpinteiro de carros); Charles-Louis Levasseur e Louis Symphorien Meunié (auxiliares de Grandjean de Montigny); Nicolas Maglioti Enout (mestre serralheiro); Jean Baptiste Level (mestre ferreiro e perito em construção naval); Louis Joseph e Hyppolyte Roy (pai e filho, carpinteiros e fabricantes de carretas e de rodas). Contando as respectivas famílias, totalizava quarenta pessoas. Pouco depois aportaram no Rio de Janeiro os irmãos Marc e Zephyrin Ferrez (escultores). Por intermediação de Antônio de Azevedo e Araújo, conde de Barca e ministro dos Negócios do Reino, alguns deles tornaram-se pensionistas da Casa Real pelo decreto de contratação de 12 de agosto de 1816 6. Eles teriam a função de conferir grandiosidade à corte migrada, preenchendo a carência de representação da monarquia nas artes visuais com cenários e construções efêmeras em madeira, tais como arcos e obeliscos para as grandes festas; mas também mudariam a fisionomia urbana do Rio de Janeiro, pontilhando o acanhado aspecto barroco da cidade com palacetes no estilo neoclássico. Com a morte de Araújo em 1817, Le Breton veria frustrado o objetivo de fundar uma Academia Real de Belas Artes 7 na corte. Melancólico, retirou-se da vida pública e se isolou na chácara que tinha no bairro do Flamengo até a morte, em 1819. Nicolas-Antoine Taunay e o filho Félix Émile Taunay foram testemunhas de José Maurício em atividade, e dele tornaram-se admiradores. Taunay retornaria à França em 1821. Em correspondências, pedia ao filho notícias do padre-mestre, a quem se referia como "le grand mulâtre". Félix permaneceu no Brasil, e transmitiu a admiração pelo compositor ao filho, o Visconde de Taunay. |
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![]() Sigismund Neukomm (1778-1858) 11. |
Algumas semanas depois da chegada dos franceses, em 30 de maio de 1816, chegou ao Rio de Janeiro, à bordo da fragata L'Hermione, a comitiva do duque de Luxemburgo, da qual faziam parte o botânico Auguste de Saint-Hillaire e o compositor austríaco Sigismund Neukomm 8. Convencido pelo Conde de Barca a permanecer no Brasil após o retorno do duque à França, Neukomm foi designado para o ensino público de música, por portaria de 16 de setembro de 1816 9. Na corte, foi professor de música do príncipe D. Pedro, de D. Leopoldina e dos demais infantes reais. Compôs, por encomenda de D. Leopoldina, uma "Grande Missa de São Francisco", oferecida por ela ao pai, o Imperador Francisco I da Áustria. Mais tarde, aceitou como aluna a esposa do Cônsul Geral da Rússia, o barão de Langsdorff. Ele foi um severo crítico do estilo operístico prevalente na música sacra da época no Rio de Janeiro, e das 45 obras que compôs no Brasil, apenas uma foi apresentada na Capela Real: a "Missa Pro Die Acclamationis Ioannes VI", composta para a aclamação de d. João VI rei de Portugal. Em meados de 1816 chegou ao Rio de Janeiro, no navio Joaquim Guilherme, o mais célebre dos castrati contratados na Itália para a Capela Real: o soprano Giovanni Francesco Fasciotti 10. Fasciotti dividiria com Antonio Cicconi, na Capela Real, as árias para soprano tão prezadas por D. João. Admirado pela pureza do timbre e pela técnica vocal, mesmo aos 66 anos de idade em 1816, seria ainda por quase duas décadas a grande atração nas temporadas líricas do Real Teatro de São João. A estréia no teatro ocorreu em 13 de maio de 1817, no papel principal de "La Vestale", de Vicenzo Pucitta, em homenagem ao emissário do império Russo. Neukomm relata a participação de Fasciotti numa serenata na casa do Marquês de Santo Amaro em 1817, na qual, acompanhado por José Maurício ao cravo, teria cantado uma barcarola. Fasciotti teria sido também professor do Dr. José Maurício Jr., que se gabou de tê-lo ultrapassado em três notas da escala musical, em aposta feita durante uma aula. |
Terminado o luto oficial pela morte da rainha, no início de 1817 começaram os preparativos para o próximo grande evento da monarquia: o casamento, do príncipe D. Pedro, primogênito da Casa Real, com com a arquiduquesa Maria Leopoldina Josefa Carolina de Habsburgo-Lorena, filha do Imperador da Áustria. O contrato foi concluído em 29 de novembro de 1816, e a cerimônia de casamento, celebrada pelo Arcebispo de Viena, se realizou por procuração no dia 13 de maio de 1817 na igreja de Santo Agostinho, em Viena. Somente em 23 de julho o casamento seria comemorado no Rio de Janeiro, com a estréia fluminense da ópera "L'oro non compra amore", de Marcos Portugal, no Real Teatro de São João. A arquiduquesa chegaria ao Rio de Janeiro em 5 de novembro. Logo após o desembarque, houve a cerimônia da bênção nupcial, na Real Capela, com missa oficiada pelo bispo e capelão-mor d. José Caetano da Silva Coutinho. Na cerimônia seria ouvida a "Missa Festiva", de Marcos Portugal, regida pelo compositor. Dois dias depois, em recepção na Quinta da Boa-Vista, seria apresentada a serenata "L'augurio di Felicità", de Marcos Portugal, por cantores da Real Câmara. E encerrando as celebrações, no dia 8 de novembro, no Real Teatro de São João, ocorreu a estréia fluminense da ópera "Merope", também de Marcos Portugal, com Fasciotti no papel principal. A arquiduquesa, que teve uma rigorosa educação religiosa e musical, trouxe na comitiva um conjunto de 16 músicos, liderados por Erdmann Neuparth, que permaneceria no Brasil até 1821. Para esse conjunto, José Maurício compôs uma série de 12 Divertimentos, recebeidos com entusiasmo, cujas partituras originais se perderiam. Há sinais de que o padre-mestre passava por dificuldades financeiras em 1817, pois solicitou neste ano a concessão de uma Casa de Aposentadoria ao Conde de Barca, que transmitiu o aviso a d. João. A resposta do rei lhe foi favorável, 12, e segundo o Almanaque Histórico e Comercial da Cidade do Rio de Janeiro, passou a residir na rua de São Jorge, atualmente rua Gonçalves Ledo. Apenas uma das obras mauricianas de 1817 é hoje conhecida: a "Trezena de São Francisco de Paula" (CPM 75), composta para a igreja do santo. Desse ano também seriam um "Beatus omnes" (CPM LXIX), para o Corpus Christi; um "Laudate pueri" (CPM LXXXIII), e os "Doze Divertimentos para instrumentos de sopro" (CPM CLXVIII), mencionados acima, e a ópera "Le Due Gemelle" (I due gemelli) (CPM CLXIX), a primeira do gênero escrita por compositor brasileiro. A partitura original mais tarde seria destruída no incêndio do Real Teatro de São João em 1825. Outro exemplar teria ficado em poder de Marcos Portugal, mas o acervo do compositor também se perdeu. Também por essa época, Marcos Portugal sofreu um estupor, que paralisou o seu braço direito. Em fevereiro de 1818, d. João foi aclamado rei João VI de Portugal, Brasil e Algarves. Uma nova ala foi construída em madeira ao lado do Real Paço, especialmente para a cerimônia de aclamação. O "Te Deum pela Feliz Aclamação" já estava composto por Marcos Portugal, provavelmente antes do derrame que sofreu. A "Missa pro die acclamationem Ioannes VI", como mencionado acima, fora composta por Neukomm. As demais celebrações de eventos ligados à família real em 1818 não tiveram a participação musical de Marcos Portugal. Em 13 de maio, celebrando o aniversário e a aclamação de d. João VI, ocorreu no Real Teatro de São João a estréia fluminense da ópera "Coriolano", de Nicolini, talvez por sugestão de Fasciotti, que já desempenhara o papel em Gênova em 1812. Em 24 de junho houve nova apresentação de "La Vestale"; e em 12 de outubro, outro espetáculo de gala pelo aniversário natalício e de casamento d. Pedro: a estréia da ópera "Camilla", de Ferdinand Paer, seguida por bailados da companhia de Luís Lacombe. O ano de 1818 foi bastante produtivo para José Maurício. Ele compôs, para a Ordem Terceira do Carmo, uma "Ladainha" (CPM 40); e um "Tantum Ergo" (CPM 83), ambos apresentados com a "Novena de N. Sr.ª do Carmo" (CPM 67); e também a "Missa para a Festa de N. Sr.ª do Carmo" (CPM 110), que regeu com os músicos da Capela Real. Compôs também um "Qui Sedes e Quoniam" (CPM 163), para o aluno Cândido Inácio da Silva. À Fazenda Real de Santa Cruz, escreveu três motetos: "Moteto dos Apóstolos" (CPM 57), um "Moteto das Virgens" (CPM 58), e o "Moteto para a Festa de Degolação de S. João Baptista" (CPM 60). E, finalmente, uma "Missa de Degola" (CPM XXCV), para a festa da degolação de S. João Baptista, terminada em 20 dias, perído passado na Real Fazenda com a família real. |
![]() Gravura satírica inglesa retratando uma festa no Rio de Janeiro. Um castrato canta, acompanhado ao piano 13. |
Em 1819, nasceu a primeira filha do príncipe Dom Pedro e da princesa Leopoldina, batizada Maria da Glória, a futura rainha Maria II de Portugal. O Senado nomeou José Maurício para reger a missa em ação de graças, celebrada na Igreja de São Francisco de Paula. O "Te Deum" fora composto por Marcos Portugal. Nesse ano, ocorreu a primeira apresentação no Brasil do "Requiem" de Mozart (K 626), em dezembro de 1819, na igreja do Recolhimento do Parto, com os músicos da irmandade de Santa Cecília, e regência de José Maurício. Neukomm escreveu um "Libera Me" baseado em alguns dos temas da obra, apresentado em sequência, e um artigo sobre a apresentação, publicado em 1820 no jornal Allgemeines Musikalisches Zeitung, de Viena, sobre a qual, dentre outros elogios, afirmou que "nada deixou a desejar" 14. Em 1819 o padre-mestre foi eleito Diretor 1º da sua querida Irmandade de São Pedro dos Clérigos 15. Em 1820, em homenagem a Le Breton, falecido em 1819, foi publicado o opúsculo Notícia Histórica da Vida e Das Obras de José Haydn, contendo o discurso que proferira em 1810 na Academia Francesa como necrológio do compositor. Com tradução de José da Silva Lisboa 16. e comentários de Neukomm, foi o primeiro texto sobre música impresso no Brasil. |
Da produção mauriciana em 1819 há somente o registro de um "Credo" (CPM CXVII), do qual não nos chegaram cópias. Do ano de 1820, um pequeno número de obras do padre-mestre são hoje conhecidas: um "Credo em Dó Maior" (CPM 122) para vozes e órgão, o salmo "Laudate Pueri" (CPM 176), para as Vésperas do Espírito Santo, e a "Missa Mimosa" (CPM 111). Provavelmente dessa época também são as "Matinas da Conceição de Nossa Senhora" (CPM 174). As obras compostas em 1820 que se perderam são: um "Magnificat" (CPMXI). um "Hino das Vésperas das Santíssimas chagas de N.S.J.C. (CPM XVII); um "Credidi" (CPM LXXIII) alternado para as referidas vésperas; uma "Missa e Credo de Santa Bárbara" (CPM CXI) para vozes e órgão; uma sequência "Victimæ Paschali" (CPM CXXV), para a missa da ressurreução do Senhor, e as "Vésperas do Espírito Santo" (CPM CXLVII), da qual só restou o "Laudate Pueri" (CPM 176). O ano de 1820 foi marcado por intensa atividade política em Portugal. O povo exigia o retorno imediato da família real, o que levou à Revolução Constitucionalista do Porto. Os aristocratas portugueses no Rio de Janeiro também davam sinais de insatisfação, pois não havia mais motivos para estarem longe do Reino. |
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Mapa do Rio de Janeiro em 1817.
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1 DEBRET, Jean Baptiste. Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil. Rio de Janeiro: Itatiaia, 1992. v.3, pr. 37. 2 Somente no século XX a "colônia" seria denominada "Missão Artística Francesa". 3 Joachim Le Breton (Saint-Méen, França, 1760 - Rio de Janeiro, 1819). Ingressou no Colégio dos Teatinos para tornar-se clérigo. Abandonou a carreira sacerdotal com a Revolução Francesa, filiando-se aos jacobinos. Trabalhou como chefe da Seção de Museus, Conservatórios e Bibliotecas, do Ministério do Interior francês, e a partir de 1795 como professor de ciências morais e políticas no Instituto de França, do Museu do Louvre. Nomeado, em 1798, administrador do acervo do Museu do Louvre, foi destituído em 1815 por ser contrário à repatriação das obras de arte adquiridas durante as guerras napoleônicas. Eleito secretário perpétuo do curso de Belas Artes em 1803, foi também destituído no início de 1816. Embarcou para o Rio de Janeiro na condição de líder da "colônia francesa", com o objetivo de promover a instrução de servidores públicos e o progresso da agricultura, mineralogia, indústria e comércio. Seu projeto de criar uma Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios seria adiado após a morte do conde da Barca, protetor dos artistas franceses, o que os levou a lecionar para um reduzido número de alunos ou a outras atividades sob a proteção régia. Morreu em 9 de junho de 1819, em sua chácara no bairro do Flamengo. Disponível em: Memória da Administração Pública Brasileira. Acesso: 29/09/2015. 4 Jean Baptiste De Bret (Debret) (Paris, França, 1768-1848). Ingressou, em 1783, no ateliê de Jacques-Louis David, mestre do neoclassicismo francês, de quem era primo. Acompanhou o mestre na sua segunda viagem à Itália, onde permaneceu por um ano. De volta a Paris, pintou quadros no estilo neoclássico com a temática de exaltanção do período revolucionário. Realizou estudos na Academia de Belas Artes de Paris, de 1785 a 1789, e na Escola de Pontes e Pavimento, futura Escola Técnica, onde se tornou professor de desenho. Premiado em 1791, expôs no Salão de Paris em 1798 e em 1805. A restauração da monarquia, a separação da mulher e a morte do único filho facilitaram a decisão de juntar-se à “colônia francesa”. Desembarcou em 1816 no Rio de Janeiro, onde tornou-se o pintor oficial da Corte, retratando cenas da nobreza, seus cerimoniais e os mais importantes eventos. Em paralelo, percorreu várias cidades do país, representando paisagens, costumes e cenas do cotidiano. Foi nomeado cenógrafo do Real Teatro São João e a partir de 1826 ministrou aulas de pintura histórica na Academia Imperial de Belas Artes, inaugurada em 1826, com um número considerável de discípulos. Em 1829, organizou a Exposição da Classe de Pintura de História da Academia, primeira mostra pública de arte no Brasil. Permaneceu no Brasil após o retorno de D. João VI a Portugal, servindo ao imperador D. Pedro I. Com a abdicação de D. Pedro licenciou-se da Academia Imperial de Belas Artes e retornou à França onde publicou uma de suas obras mais conhecidas, o livro Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil, entre 1834 e 1839. Em 1837, o governo brasileiro lhe concedeu uma pensão como reconhecimento pelos serviços prestados. Morreu em Paris, em 28 de junho de 1848. Disponível em: Memória da Administração Pública Brasileira. Acesso: 17/10/2015. 5 Nicolas Antoine Taunay (Paris, 1755 - 1830). Pintor, ilustrador, professor. Iniciou os estudos de pintura em 1768, nos ateliês de François Bernard Lépicié, Nicolas Guy Brenet e Francisco Casanova. Foi aceito, em 1784, como agregado na Academia Real de Pintura e Escultura. Foi indicado para pensão de três anos na Academia do Palácio Mancini, em Roma. Retornou à França em 1787 e expôs nos salões parisienses. Em 1793, com a extinção das instituições monárquicas em consequência da Revolução Francesa, retirou-se de Paris, retornando em 1796 para integrar o recém-criado Instituto de França. Com o fim do império napoleônico, viajou para o Brasil como integrante da "colônia" Francesa. Chegado ao Rio de Janeiro em 1816, tornou-se pensionista de D. João VI (1767 - 1826) e professor de pintura de paisagem da Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios. Em 1821, após desentendimentos surgidos pela nomeação de Henrique José da Silva (1772 - 1834) para a direção da Escola, retornou à França. Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural. Acesso: 29/09/2015. 6 As pensões totalizavam 8:032$000 por ano, assim distribuídas:
7 O objetivo de Le Breton seria apenas adiado. A Academia Imperial de Belas Artes só seria inaugurada em 1826, quando parte dos integrantes da "colônia" já haviam retornado à França. 8 Sigismund Neukomm (Salzburgo, Áustria, 1778; Paris, França, 1858). Iniciou os estudos de música na cidade natal com o organista Weissauer e depois com Michael Haydn, mestre de capela e organista da catedral. Em paralelo estudava filosofia e matemática na Universidade. Em 1792 foi indicado organista honorário da igreja da instituição e, em 1796, Mestre-do-Coro do teatro da corte. Mudou-se para Viena aos 16 anos, onde foi por sete anos aluno do o grande Joseph Haydn, irmão de Michael. Em 1804 viajou para a Rússia, recomendado por Haydn à czarina Maria Fiodorovna para ocupar o cargo de mestre de capela em São Petesburgo. Trabalhou também no Teatro Alemão desta cidade, e como músico autônomo em Moscou. Em 1809 partiu para Berlim, então ocupada pelos franceses, e retornou a Viena, para visitar o velho mestre. Dele teria recebido a incumbência de terminar algumas das suas obras inéditas, e orquestrar e reduzir para piano de várias outras. Em 1810 estabeleceu-se em Paris como pianista da casa do príncipe de Talleyrand. Regeu na catedral de Notre-Dame, em presença da família real, um "Te Deum" de sua autoria, em ação de graças pela entrada solene em Paris do rei Luís XVIII. Acompanhou Talleyrand, nomeado ministro de negócios estrangeiros, ao Congresso de Viena (1815), quando teve o seu "Grande Requiem em dó menor", composto para o aniversário da morte de Luis XVI, apresentado na igreja de Santo Estêvão, com 300 cantores regidos por Salieri. Pouco depois recebeu do rei a insígnia de Cavaleiro da Legião de Honra. Em 1816, foi convidado a integrar a comitiva do Duque de Luxemburgo, diplomata francês enviado como embaixador extraordinário à corte do Rio de Janeiro, quando restabelecidas as relações diplomáticas entre a França e Portugal. Neukomm foi convidado pelo Conde da Barca, ministro do reino, francófilo e grande incentivador das artes na corte, a permanecer no Rio de Janeiro. O ministro hospedou o compositor em sua própria casa, para garantir a presença de um músico de renome na corte. Permaneceu no Rio de Janeiro até 1821. Sua presença contribuiu para a popularização das obras de Haydn e de Mozart no Brasil. Em toda a carreira, compôs cerca de 1.800 obras. 9 "Tendo consideração ao reconhecido merecimento de Sigismund Neukomm na arte da música que distintamente professa e querendo que o Meu Serviço se utilize dele tanto para o ensino público da referida arte, como para todas aquelas composições que Eu For Servido encarregá-lo: Hei por bem fazer-lhe mercê de uma pensão de 800$000 anuais paga a quartéis pelo Meu Real Erário, sendo também obrigado a tocar todas as vezes que para isso for avisado. O Marquês de Aguiar, do Conselho de Estado, Ministro assistente ao despacho do Gabinete e presidente do Meu Real Erário o tenha assim entendido e o faça executar. Palácio do R. J., 16.IX.1816". Arquivo Nacional, decretos sobre fazenda, Livro 1, p. 183v. In ANDRADE, Ayres de. Francisco Manuel da Silva e seu tempo: 1808-1865 - Uma fase do passado musical do Rio de Janeiro à Luz de novos documentos. Rio de Janeiro: Edições Tempo Brasileiro. 1967. v. 2, p. 206. 10 Giovanni Francesco Fasciotti (Peia, Itália, 1750 - Rio de Janeiro, 1840). Segundo Fétis, começou a carreira de cantor em Pisa, a serviço da capela musical e em atividades teatrais, embora sua presença não esteja documentada nos arquivos da cidade. Atuou em 1799, no Teatro Filarmônico, em Verona, na ópera "Il retorno di Serse", de Marcos Portugal, papel que repetiria em 1804 no Teatro Pergola, em Florença. Em Milão, no carnaval de 1800, foi suplente no drama "Idante ovvero I sacrifici d'Eccate", de Marcos Portugal, representado no La Scala. Em 13 de janeiro de 1801 participou no San Carlo de Nápoles, com o tenor D. Mombelli, da ópera "Ginevra ed Ariodante", de Giacomo Tritto, no papel de Ariodante. Em novembro ele se apresentou novamente no S. Carlo, no papel de Alluccio, em "Scipione in Cartagena", de D. Cercià. No mesmo teatro, em 12 de janeiro de 1802, representou Atamaro, na ópera "Sesostri", de G. Andreozzi, também com Mombelli. Em setembro de 1803 foi para Bolonha, na condição de "agregado do compositor mestre" na Academia Filarmônica. No outono desse ano, no Teatro Comunale de Bolonha, participou "La selvaggia nel Messico" de G. Nicolini, no papel de Corasco. No carnaval em 1806 foi para o Teatro Imperial (ex-Real), em Turim, onde personificou Conrad na ópera de mesmo nome por F. Orlandi. Retornou em 8 de fevereiro de 1808, atuando com a mezzo-soprano M. T. Belloc Giorgi e o tenor S. Gentile, em "La conquista delle Indie orientali" por V. Federici. Em 23 de março de 1811 no La Scala em Milão personificou David, no oratório "Saulle ovvero Il trionfo di Davide", de N. Zingarelli. No carnaval de 1812 no teatro S. Agostino de Gênova, participou no papel de Coriolanus, da ópera de mesmo nome, de Nicolini. Em 26 de dezembro desse ano no teatro Argentina, em Roma, desempenhou o papel-título na ópera "Tito in Langres" A. Del Fante. Em fevereiro de 1813, no mesmo teatro, interpretou Idreno em "Amurat II", de Pietro Raimondi. De volta a Turim, em 1814, participou da ópera "Bajazet", de P. Generali, encenada no no Teatro Imperial durante o carnaval. No mesmo teatro desempenhou o papel principal no "Cesare in Egitto" de E. Paganini. Após 1815, não há registros sobre a atuação de Fasciotti em palcos italianos. Chegou ao Rio de Janeiro em 1816, com a irmã, Maria Teresa, após assinar contrato em Lisboa, pelo qual receberia 720$000 anuais, mais 180$000 do "Real Bolsinho" e 306$000 (25$500 mensais) para moradia. Estreou em 13 de maio de 1817 no Real Teatro de São João, no Rio de Janeiro, em "La Vestale", de Pucitta. Em novembro participou da estréia fluminense da ópera "Merope", de Marcos Portugal. Em 1818, traz à cena o "Coriolanus" de Nicolini. Em 13 de maio de 1820 obtém sucesso no papel principal de "Aureliano in Palmira", de Rossini, No ano seguinte, o papel principal em "Tancredi", de Rossini, o consagraria em definitivo; o mesmo papel se repetiria em 22 de janeiro de 1826, em comemoração do aniversário da Imperatriz Leopoldina. Nesse ano repetiria o sucesso dos papéis em "Aureliano em Palmira", de Rossini, e "La Vestale " de Pucitta. Em 12 de julho de 1828, novamente se destaca no papel principal em "Otello", de Rossini. Em 1829 renovou por mais seis anos o contrato com a Capela Imperial, passando a receber 745$000 anuais, os demais rendimentos que já recebia, e mais 180$000 como aposentado, com o direito a 480$000 ao final do contrato a título de gratificação. Esteve entre os poucos na capela que escaparam da demissão em massa em 1831. Em 1833, aos 83 anos, conforme notícias nos jornais, continuava a cantar na Capela Imperial e no Real Teatro de São Pedro de Alcântara. Fontes: Treccani, La Cultura Italiana. Acesso: 25/19/2015; PACHECO, Alberto José Vieira. Giovanni Francesco Fasciotti. In Dicionário Biográfico Caravelas. Lisboa: Núcleo de Estudos da História da Música Luso-Brasileira, 2010; e ANDRADE, op. cit., v. 2, pp. 164-167. 11 MATTOS, op. cit., 1997. Caderno de fotografias, p. XII. 12 "El Rei Nosso Senhor atendendo ao que lhe representou o Padre José Maurício Nunes Garcia, Mestre de Música de sua Real Capela É servido ordenar que V. Sª lhe dê Casas de Aposentadoria para sua habitação, as quais devem ter o espaço necessário para aí dar sua Aula de Música, o que participo a VSª para sua inteligência e execução. Deus guarde V. Sª. Paço, 17 de fevereiro de 1817 [...] Conde da Barca. MATTOS, op. cit., 1997. p. 131. 13 A.P.D.G. A party at Rio de Janeiro. In MATTOS, op.cit., 1997. Caderno de fotografias, p. XIII. 14 "Rio de Janeiro. A corporação dos músicos (da Irmandade portuguesa, uma espécie de corporação religiosa) celebra, celebra, anualmente, a festa de Santa Cecília a que se segue [...] a missa em memória dos músicos falecidos no correr do ano. Para esse propósito alguns membros dessa corporação, que possuem sensibilidade pela melhor música, recomendaram, por ocasião do último festejo, o "Requiem" de Mozart, executado por uma grande orquestra no último dezembro, na Igreja do Parto. A regência de todo o conjunto coube ao maestro da Capela Real, Padre José maurício Nunes Garcia. O entusiasmo com que o Padre Garcia trabalhou todas as dificuldades a fim de, também aqui, executar, ao menos uma vez, a obra-prima do nosso imortal Mozart merece os agradecimentos mais calorosos dos amigos da arte que aqui se encontram. De minha parte, sinto-me na obrigação de aproveitar essa oportunidade [...] Ele provoca, justificadamente, a mais qualificada atenção e surpresa, uma vez que sua formação é sua própria obra. Nascido no Rio de Janeiro, entrou para o seminário episcopal dessa cidade onde se fez finalmente mestre de capela, após a conclusão dos estudos e a sua ordenação. Com a chegada da corte ao Brasil, obteve o lugar de mestre de capela da Capela Real, que continua assumindo, não obstante negligenciando seu estado delicado de saúde. Antes do "Requiem", cantaram-se os "Nocturnen" extraídos do "Officio Defunctorum" de David Perez [...] A execução da obra-prima de Mozart nada deixou a desejar; todos os talentos ambicionavam recepcionar, com dignidade, o estrangeiro Mozart nesse novo mundo. Essa primeira tentativa foi, em todas as perspectivas, tão satisfatória que se espera não ser a última dessa espécie. Junho n° 29". MATTOS, op. cit., 1997, pp. 143-144. 15 DINIZ, Jaime. A Presença de José Maurício na Irmandade de São Pedro. In MURICY, José Cândido de Andrade et alii. Estudos Mauricianos. Rio de Janeiro: INM/FUNARTE/PRÓ-MEMUS, 1983. p. 43. 16 José da Silva Lisboa, Visconde de Cairu (Salvador, 1756 - Rio de janeiro, 1835). Filho de Henrique da Silva Lisboa e de Helena Nunes de Jesus. Bacharel em direito canônico e filosófico pela universidade de Coimbra, onde se aplicou no hebraico e no grego. Depois de formado, retornou à Bahia, sendo nomeado professor de filosofia e grego. Retornou à Portugal em 1797, onde obteve o cargo de deputado e secretário da mesa de inspeção da cidade da Bahia. Em 1804 publicou sua obra capital, "Princípios de economia política", o primeiro livro que sobre o assunto em português, inspirado no trabalho de Adam Smith. Deixou o cargo em 1808 para acompanhar d. João VI ao Rio de Janeiro, sendo nomeado desembargador na mesa do Desembargo do Paço; deputado da Junta do Comércio, Agricultura, Indústria e Navegação, cargo que exerceu até o fim da vida. Impulsionou a criação de uma aula de economia política e colaborou na redação dos decretos que ditaram a abertura dos portos brasileiros e o levantamento da proibição da instalação de manufaturas no Brasil. Em 1809 foi incumbido de organizar um código de comércio. Em 1815 foi nomeado censor do Desembargo do Paço, e encarregado do exame das obras para a impressão. Em 1821, foi incluído na lista dos membros da Junta de Cortes para o exame das leis constitucionais discutidas em Lisboa. Representante da Bahia na Assembleia Constituinte, se pronunciou com aplauso sobre a liberdade religiosa, então em discussão. Comendador da ordem de Cristo e oficial da do Cruzeiro; membro da sociedade auxiliadora da indústria nacional do Rio de Janeiro, da sociedade de Agricultura da Bahia, e de sociedades internacionais. BLAKE, Augusto Victorino Alves Sacramento. Dicionário Bibliográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1883-1902. v. 5, pp. 193-203. 17 SANTOS, Luís Gonçalves dos. Memórias para servir à História do Reino do Brasil divididas em três epocas da felicidade, honra, e glória, escritas na Corte do Rio de Janeiro no ano de 1821, e oferecidas a S. Majestade El Rei Nosso Senhor D. João VI . Lisboa: Impressão Régia, 1825. 454p, p. LXXII. |